domingo, 16 de setembro de 2018

Minhas repetições e padrões

Li esses tempos que precisamos nos libertar de nossos traumas do passado, principalmente a respeito do eixo masculino e feminino, para podermos amar as pessoas de forma plena e livre. De acordo com esse livro, alguns estudos de psicologia dizem que repetimos em nossas relações os padrões construídos quando crianças em nosso núcleo familiar. Mais do que isso, ouvi dizer que pegamos os traumas vividos (sim, porque todos vivemos pequenos traumas) e repetimos essas situações em nossas vidas como uma forma de tentar que, dessa vez, as coisas sejam diferentes.
No meu caso, por exemplo, cresci em um ambiente em que recebia pouca atenção das pessoas as quais eu amava. Além de pouca presença física, coisa que quase toda pessoa vai viver em sua infância devido a vida profissional dos pais e está tudo bem, também precisei conviver com uma ausência emocional. Não me recordo exatamente como isso acontecia em minha infância, mas consigo me lembrar de diversos eventos nos quais me senti sozinha fisicamente ou mesmo próxima de meus pais. Já chorei no carro da minha mãe na volta de uma festa enquanto ela simplesmente ficava calada, sem ao menos me perguntar se eu gostaria de falar o que aconteceu ou se ela poderia fazer algo para me ajudar. Eu só queria que ela me consolasse. Já passei meu aniversário aos prantos e, em resposta disso, meus pais pegaram o carro e me levaram ao cinema. Mas eu só queria me sentir amada no dia mais especial do ano para mim. Eu me preocupava demais se um amigo iria a minha festa de aniversário e ficava amplamente frustada com o atraso de algum deles, porque queria ser aceita.
O reflexo de tais ações na minha infância fizeram com que eu me sentisse sempre desamparada. Hoje, sempre espero que alguém rompa esse padrão. Torço para um dia alguém se importar. Com isso, acabo colocando muita expectativa nas pessoas. A angústia de sempre esperar que dessa vez eu seja escutada faz eu ficar sempre decepcionada. Em certas ocasiões, tento pensar pelo lado bom, pois geralmente não procuro mais por alguém para resolver meus problemas, pois geralmente já entendo que "estou sozinha nessa". Tenho que tomar minhas decisões sozinha, ser forte e enfrentar esse mundo, curar uma doença sozinha, decidir mudar de país por conta própria. Mas a verdade é que, no fim das contas, busco atenção em todo e qualquer canto. Eu aceito migalhas. Me apego a qualquer um que mostre uma sutil preocupação e, nesses casos, sempre passo do ponto. Eu sempre falo de uma forma a buscar a atenção. Exagero na atuação, tento mostrar que estou necessitando de cuidados. Eu sempre espero uma mensagem, uma ligação, um convite, um encontro. Ninguém jamais seria capaz de me oferecer o cuidado que preciso.
Como se não bastasse esses efeitos, a ausência não foi meu único trauma. Eu também recebi muita cobrança dessas pessoas que me foram ausentes. Sei, desde criança, quais caminhos profissionais deveria seguir, quais notas deveria tirar, com quantos anos deveria me casar, escutei muito sobre o perigo que seria ter um filho. Não me explicaram como ou porque, mas falaram o que eu devia fazer. E fui lá e fiz. E fazendo, ouvi que não era nada demais o que fiz. Ouvi que estavam decepcionados por eu não ter passado em uma faculdade tão boa. Uma nota boa não era mais que obrigação. Ser aprovada para um intercâmbio não foi nada demais. Já ouvi do meu pai falar "sinto muito que coloquei muitas expectativas sobre você" Isso porque segui exatamente todos os passos que esperavam de mim, se não mais. 
Mas sinto que simplesmente fiz tudo isso por obediência. Em meio a tantas demandas que me foram impostas, obedecer nunca foi um problema para mim. O problema é que essa obediência me rendeu uma eterna sensação de impotência. Primeiramente, não sei o motivo pelo qual fiz todas as coisas que fiz. Eu quis todas aquelas coisas, mas não sei o motivo desse desejo. Tenho tudo o que teoricamente gostaria, mas não sei porque estou aqui e muito menos o que estou fazendo aqui. E ninguém liga.
Em segundo lugar, me questiono se essa foi minha forma de tentar chamar atenção e ser devidamente amparada, o que teria tudo a ver com o primeiro trauma. Aquele trauma também aparece aqui, pois nunca obtive algum reconhecimento sobre minhas "conquistas". Bom, se meus pais não me reconheceram, quem sabe um namorado me reconheça? Quem sabe um professor me reconheça? Quem sabe um estranho na internet me reconheça. NÃO. Ninguém vai me reconhecer. 
Ainda, passei a duvidar de qualquer reconhecimento recebido. Notas boas não são nada demais, minha inteligente foi sempre menosprezada. Esse menosprezo me segue e repito, em outras relações, com a expectativa de finalmente não ser menosprezada. E, novamente, espero demais das pessoas. Eu não acreditava em um namorado quando ele me achava bonita. Eu não me senti inteligente apesar de ser aprovada no mestrado. 
Tenho pais extremamente orgulhosos, eu sei. Mas esse reconhecimento fica só no coração deles e infelizmente preciso de provas de afeto depois de tanta falta. Não é falta de amor, não duvido que minha família me ama. Mas aprendi que amar não basta. A gente precisa ter responsabilidade com o que falamos para alguém e também com aquilo que deixamos de fazer com alguém amado. Sei que preciso a prender a não culpá-los, mas ainda não sou capaz. E sinto que antes de finalmente parar de culpá-los, preciso superar essas dores e encontrar força dentro de mim.
Em meio a esses paradoxos, essas repetições são tão inconscientes que eu não acho me sinto capaz de dizer quando estou as repetindo. Ao menos, hoje posso dizer que sei sobre os motivos pelos quais repito esses padrões. 



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